Decisão parcial sobre piso passa a valer na virada do ano
Supremo Tribunal Federal (STF) julgou ação de governadores contra a Lei 11.738/2008 em caráter cautelar. Remuneração mínima de R$ 950,00 foi mantida, mas 1/3 da carga horária para atividade extra-classe ficou de fora
Por Bianca Pyl
A partir de 1º de janeiro de 2009, os professores da educação básica pública do Brasil devem passar a receber pelo menos R$ 950,00 mensais, mas não poderão contar com um terço da carga horária para atividades fora da sala de aula. Assim decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão do último dia 17 de dezembro de 2008.
O tribunal acatou dois dos quatro itens contestados pelos governadores de Santa Catarina, Luiz Henrique (PMDB); do Paraná, Roberto Requião (PMDB); de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB); do Ceará, Cid Gomes (PSB); e a governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.167 contra a Lei 11.738/2008, que institui o piso nacional para professores da educação básica pública.
Os governadores de São Paulo, José Serra (PSDB); de Minas Gerais, Aécio Neves (PSDB); de Roraima, José Anchieta Júnior (PSDB); do Distrito Federal, José Roberto Arruda (PFL); e do Tocantins, Marcelo Miranda (PMDB) apoiaram a ADI contestatória assinada pelos colegas.
Os ministros do STF permitiram que ganhos extras sejam incorporados para que os professores possam receber o valor mínimo de R$ 950,00 por mês. Para Roberto Leão, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), será um ganho poder contar com esse valor em muitos estados brasileiros já em janeiro, mesmo somado a gratificações.
Na visão do sindicalista Roberto, os ministros optaram por uma interpretação "conservadora" e "o Supremo desconsiderou a vontade soberana do povo brasileiro expressa por unanimidade pelo Congresso Nacional". A Lei 11.738/2008 foi aprovada no Parlamento depois de um processo de negociação com representantes dos governos e da sociedade civil.
De acordo com Daniel Cara, coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, a posição do Judiciário teve uma carga negativa. A impressão transmitida para a opinião pública - de que o piso nacional foi mantido - não corresponde com o que ficou decidido. "Não existe piso sem vencimento inicial e definição de carga horária", ponderou.
Daniel criticou também a opção pelo julgamento "desmembrado" da medida cautelar. "Os ministros dividiram os itens contestados pelos governadores e julgaram separadamente. Se isso não tivesse sido feito, com certeza teria sido indeferida a ação [por completo]. O STF agiu como legislador e não cumpriu sua função judicial, seu papel era julgar a inconstitucionalidade da lei".
A medida foi julgada em caráter cautelar. Haverá um julgamento definitivo do mérito que pode determinar que a Lei 11.738/2008 seja adotada na íntegra. Não há prazo, entretanto, para que o STF aprecie a questão.
Relator do processo, o ministro Joaquim Barbosa votou pelo indeferimento da ADI, seguido por Carlos Ayres Brito. Já os demais ministros acataram parcialmente o pedido de liminar. Os governadores perderam a ação contra a constitucionalidade da criação do piso salarial nacional: nenhum estado e município do país poderá pagar valor inferior a R$ 950,00 a partir do primeiro dia de 2009, reajustado conforme o artigo 5º da lei.
Porém, os argumentos apresentados pelos governos estaduais contra o aumento do tempo de planejamento de aulas foram deferidos. Prevaleceu o entendimento de que o tema é sujeito às especificidades em cada estado e exige uma discussão de mérito mais aprofundada.
Um grupo de organizações não-governamentais (ONGs), movimentos sociais e redes da sociedade civil enviou ao STF uma petição na condição de Amicus Curiae, no dia 27 de novembro de 2008, para defender a Lei 11.738/2008, que institui o piso nacional para os professores. A CNTE e o Sindicato dos Servidores do Magistério de Curitiba também enviaram petições ao Supremo, que ainda não se posicionou sobre essas peças.
Durante a 3ª Reunião do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), realizada em 31 de julho em Porto Alegre (RS), os governadores apresentaram a estimativa de que a lei causaria um impacto de R$ 5,9 bilhões nos dez estados e que seria necessário contratar 125 mil professores para aumentar a jornada de um terço fora da sala de aula.
O governo de São Paulo se pronunciou contra a determinação de garantia do tempo para as atividades extra-classe, segundo Maria Izabel Azevedo de Noronha, que preside o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). "É lamentável a decisão do governo estadual de São Paulo de contabilizar como horário para preparação de aulas e correção de provas os 10 e 15 minutos que complementam a jornada de 60 minutos dos professores da rede estadual. Nestes intervalos, o professor não tem a menor condição de pensar e realizar nenhuma tarefa".
Os argumentos com base na impossibilidade de se pagar o valor do piso, alegados pelos governadores, não são válidos na opinião de Roberto leão, da CNTE. "A lei também diz que o governo federal poderia ajudar os estados que não puderem pagar o valor. O governo de São Paulo se posicionou contra, mas sabemos que é o estado de maior poder econômico do país".
Histórico
A Lei 11.738/08 é considerada uma vitória histórica para a categoria. Sancionada pelo presidente Lula em 16 de julho de 2008, o projeto foi apresentado pelo senador Cristovam Buarque (PDT-DF) e tramitou por 13 meses na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
A nova lei assegurava salário de R$ 950 sem bonificação, o que garante uma aposentadoria calculada em valores reais. A medida estabelece o reajuste anual automático do valor do piso. Outro ponto considerado de extrema importância pela categoria é a reserva de um terço da jornada de trabalho do docente para atividades extra-classe. Por exemplo, professores com carga horária de 40 horas semanais teriam 27 horas dentro da sala de aula e 13 horas para formação, preparação das aulas, correção de provas.
Em 1989, o deputado Gumercindo Milhomem (PT-SP) foi o primeiro parlamentar a apresentar um projeto de lei propondo a criação do piso salarial nacional, mas no Congresso a proposta foi rejeitada. Em 2006, a Medida Provisória (MP) 339 regulamentou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e estipulou o prazo de 90 dias (30 de abril de 2007) para que fosse encaminhado projeto de lei sobre o piso salarial ao Congresso Nacional.(Repórter Brasil)

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