Após meia vida no Japão, a volta forçada e o recomeço do zero
Publicado por Kassu - 05/03/2009 às 10h43
AGUA BOA NEWS
Por Jacqueline Lopes
Com a redução da produção industrial no Japão, o desemprego assombra o que para muitos brasileiros descendentes nipônicos já foi um ‘oásis’ de oportunidades. Pelo menos 50 mil estrangeiros podem ter que deixar o país, a maioria brasileiros. A outra faceta do capitalismo mexeu não apenas com a estrutura de um país, mas principalmente, com a vida daqueles cuja única esperança de melhorar a vida era o trabalho no exterior.
“Em 1995, eu avisei que se não fizessem o pé de meia lá no Japão, iam catar papelão no Brasil”, diz Fernando Ireijo, de 62 anos. Ele morou seis anos no Japão, na década de 90. Em só dois anos teve a companhia da esposa Ilma Miashiro Ireijo, de 52 anos. “Eu vi muita gente lá separando da mulher e no vício do jogo. Naquele tempo eu avisei que tinha que economizar”.
Os anos no auge da economia japonesa foram suficientes para o casal voltar, comprar uma barraca na Feirona e depois, o Balabuska Bar, no Bairro Monte Líbano. Hoje, Seo Ireijo, que trabalhou 2.100 dias nas indústrias japonesas, 14 horas por dia (29.400 horas) sem folgas semanais comemora o esforço.
“Eu trabalhei muito, mas hoje sou patrão. Aqui estou no céu. Não tem lugar melhor que meu País. Se existe algum lugar melhor que o Brasil me diz!”.
‘Sem-teto’
No próprio Balabuska bar, outras duas pessoas têm histórias diferentes sobre a temporada vivida no Japão, onde o salário pago por mês era de pelo menos R$ 5 mil.
O auxiliar de cozinha Luciano Aguena, de 34 anos, e o segurança Jorge Toshio Sato, de 35 anos, foram para o Japão na década passada. A crise que se acentuou a partir de outubro do ano passado foi o sinal de que havia chegado a hora de voltar ao Brasil.
Luciano e Jorge integram a multidão de dekasseguis (brasileiros que trabalham no Japão) que voltaram por conta do desemprego. A crise internacional surgiu no sistema financeiro norte-americano, rapidamente se alastrou para Japão e Europa, baluartes do capitalismo.
Luciano ficou 17 anos no Japão, não pensa em retornar nunca mais. Jorge não vê a hora de ser chamado de volta. Os dois não concluíram o Ensino Fundamental no Brasil, passaram a metade das suas vidas na terra dos ancestrais, trabalhando e gastando tudo o que ganhavam. Nunca imaginaram que o sonho tivesse fim.
Recomeçar
Luciano Aguena voltou do Japão há cerca de 4 meses, enfrentou o desemprego no Brasil e agora conseguiu o trabalho de auxiliar de cozinha do Balabuska. Entre o trabalho de lavar os copos, talheres e pratos sujos ele falou com o Midiamax na noite de sexta-feira.
Ele não parou, mas conseguiu ser atencioso e falar da vida sem pudor ou constrangimento.
Aguena diz que nunca se sentiu pressionado a juntar dinheiro e que o Japão é página virada. Agora, ele vai se esforçar, terminar os estudos para ser um médico nutricionista, diz.
Ele não pensa em voltar para o Japão. No País, viveu dois casamentos – com brasileiras – sentiu a dor do rompimento e também da divisão do dinheiro economizado. Hoje, ele mora sozinho numa kitinete.
“Eu já queria ter voltado para o Brasil. Lá no Japão eu estava trabalhando em uma fábrica de assoalho. Foram 17 anos lá. Estava desatualizado e queria voltar para estudar. Tive dois casamentos que não deram certo. A única coisa que sinto falta é da comida”.
‘Bico’
‘Vou fazer um ‘bico’ no Brasil até melhorar a situação lá no Japão’. Do lado de fora do bar, onde cuida dos carros dos clientes e faz a segurança do prédio, Sato conversou com a reportagem. Ele retornou há 1 ano pela falta de emprego.
Entre um trago de cigarro e outro, ele disse que sabe o que quer da vida. Morar para sempre no Japão.
Os 18 anos que morou no Oriente foram suficientes para ele aproveitar o que o dinheiro pode oferecer. Mas, como também teve que deixar metade de tudo que tinha para esposa brasileira aprendeu a aceitar a realidade.
“Trabalhei em muita coisa. Em montagem de moto da Suzuki, indústria de vidro, de celulose. Sinto falta de tudo porque lá nunca falta nada. Aqui a gente não tem dinheiro e faz dívida. Lá somos discriminados pelos próprios brasileiros que negam uma caixa de fósforos. Não é como aqui que um copo de óleo é dividido”, diz.
Foto: Alessandra Carvalho
“Passando a crise eu já volto, vazo para lá. Não quero saber daqui não. Lá não tem vandalismo, ladrão. O Japão é um país que pode confiar. Meu projeto é montar uma locadora para brasileiros”.
Mas, enquanto a crise não passa, ele pensa em se harmonizar com uma brasileira para voltar com uma companheira certa e lá fazer o ‘sonhado pé de meia’.


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