Daniel diz que pirataria pode ajudar a difundir seu filme
Editado por Kassu - 05/03/2009 às 13h02
AGUA BOA NEWS
Por Ana Paula Souza
O cantor Daniel, protagonista do filme O Menino da Porteira, que estréia amanhã em todo o País, descobriu algumas coisas ao debutar no ofício de ator. Uma, é que existem jornalistas que não fazem perguntas sobre sua vida pessoal.
“Quando lanço um disco, o repórter sempre envereda para coisas particulares, de namorada, se vai ter casamento. Agora, com o filme, eu não tive esse tipo de abordagem”, diz. “Ficam me perguntando de roteiro, essas coisas.”
A outra descoberta de Daniel é que, ao contrário do que acontece com a música, o cinema não necessariamente chegará onde seu público está. A razão é simples: 90% dos municípios brasileiros não possuem salas de cinema.
Daniel sabe que parte de seu público não tem dinheiro para ir ao cinema ver O Menino da Porteira
Nesta entrevista concedida por telefone, num intervalo das gravações da novela Paraíso, em que também fará o papel de um boiadeiro, Daniel, sempre gentil, parecia medir as palavras com régua. Artes e manhas de quem, há muito tempo, sabe o que é lidar com a mídia.
“Eu vejo assim um carinho muito grande, um respaldo grande por arte da imprensa. E vejo que está, graças a Deus, muito bem divulgada essa questão toda do filme”, diz, à la jogadores de futebol falando sobre o desempenho do time.
OU PIRATA, OU NADA
É também com cautela, mas com uma visão incomum em artistas bancados pela indústria, que Daniel toca no assunto pirataria. “É muito maluco isso. As pessoas adquirem o filme na internet. É tanta rapidez e perfeição… Como segurar isso tudo?”, pergunta, quase como se respondesse.
“Antes de o filme ser lançado, é complicado. Mas, depois, a gente vai ter que ter noção que, se o filme tiver respaldo, vai ter certa procura da pirataria. Você viu o que aconteceu no Tropa de Elite? Foi pirateado, mas teve sucesso de público também. Então…”.
Daniel parece ter consciência de que O Menino da Porteira, refilmagem de um sucesso popular dos anos 70, não cairá no gosto do público freqüentador dos mais luxuosos shoppings e que parte de seus fãs não tem acesso ao cinema.
“Uma fatia de pessoas mais humildes talvez encontre mais dificuldade. Além de ser caro, o cinema fica em shopping, aí é difícil pro pessoal da roça”, admite o cantor.
Para o público do interior, onde não há cinemas, dvd pirata pode ser a única alternativa
Diante disso, cabe a pergunta: se ele souber que, numa cidade pequena, sem cinema, alguém viu o filme num DVD pirata, ficará chateado? “Acho que é uma coisa quase normal. Lógico que a gente gostaria que fosse tudo da forma correta, mas não é assim”, diz.
“Tem amigos meus, como Bruno e Marrone, que começaram a fazer sucesso depois da pirataria. O complicado é que a pirataria tira emprego, não gera benefício pra ninguém. Mas às vezes a pessoa só vê assim.”
Daniel lembra que, quando começou a carreira, vendia entre 700 mil 1 milhão de discos num lançamento. “Hoje, pra você vender 100 mil cópias é um Deus nos acuda.”
Mas Rodrigo Saturnino Braga, diretor-geral da Sony Pictures no Brasil, co-produtora e distribuidora do filme, muda o ângulo da discussão e aposta:
“Os DVDs piratas também não chegam nas cidades que não têm cinema. Eles são vendidos aqui debaixo do meu escritório, na Berrini”, diz o executivo da Sony.
Preocupada em evitar a pirataria antes da estréia, a Sony, nas pré-estréias para convidados e nas sessões de imprensa, proibiu a entrada na sala com aparelhos celulares – o que deixou muita gente irritada.
“Temos que tomar todas as precauções”, diz Saturnino Braga. “O Tropa de Elite, se não fosse a pirataria, teria feito mais 1,5 milhão de espectadores.”
LANÇAMENTO POPULAR
Certa de o público de O Menino da Porteira está nos interiores e periferias do Brasil, a Sony fará um lançamento atípico. Braga, um dos maiores entendedores do mercado cinematográfico nacional, traçou uma estratégia clara:
- Vamos lançar o filme com 270 cópias, mas não teremos Shopping Iguatemi, Pátio Higienópolis, Leblon, Copacabana. Esse filme vai para salas que, muitas vezes, nem conseguem cópias para exibir os filmes na semana de lançamento. Os donos de salas do interior vieram todos pedir cópias para a gente.
Mas será mesmo que O Menino da Porteira conseguirá repetir ao menos parte do sucesso que teve nos 1970? Àquela altura, o circuito era outro.
Havia cinemas de ruas, salas populares e baratas. Será que o cinema hoje comporta uma opção puramente popular? Os dois maiores sucessos dos últimos 15 anos, 2 Filhos de Francisco e Se Eu Fosse Você 2 mobilizaram também as classes A e B.
Já O Menino da Porteira, pela ingenuidade da história e pelas músicas caipiras, parece destinado a um público que, simplesmente, deixou de ir ao cinema – pelo preço do ingresso e pela localização das salas.
“É a grande pergunta que me faço”, diz Saturnino Braga. “Mas esse filme vai nos ensinar algumas coisas ainda.”
Dirigido por Jeremias Moreira que, além da primeira versão, dirigiu também Fuscão Preto, nos anos 1980, o filme tem em Daniel, um boiadeiro boa praça, seu principal chamariz – ou, para parte do público, seu principal problema.
Mas, atentos a quem não gosta de Daniel, os produtores O Menino da Porteira optaram por uma trilha sonora, dirigida por Nelson Ayres, que reúne o que poderíamos chamar de clássicos das canções caipiras. O cuidado técnico também é claro, a começar pela fotografia de Pedro Farkas.
Já o roteiro e a direção são de uma simplicidade que remete aos anos 1950, com direito a história de amor, claro. Evidentemente pensado para atrair os fãs de 2 Filhos de Francisco, o filme é mais uma das tentativas que o cinema brasileiro faz de encontrar o público.
Cabe lembrar que, no ano passado, os filmes nacionais responderam, ao todo, por 10% dos ingressos vendidos no país. Não à toa, Daniel intui que parte do público verá seu filme em DVDs piratas.


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